Imagem retirada daqui.
O homem, na esplanada, come amêijoas de uma travessa. Eu tinha andado na falésia à procura de vestígios árabes e encontrara um concheiro pré-histórico de cascas de amêijoas como aquelas, e agora o tempo tornou-se vibrátil, com seus cílios inteligentes, e dele emerge o desconforto de não ter pela frente senão o destino que vai do concheiro à esplanada. Como espécie, não valemos muito, dissera-me Judite. Falávamos de outra coisa, mas esse desencanto também serve aqui. Nunca fomos divinos, nunca incendiámos até ao céu a revolta do deus, para a darmos a nós mesmos. Vamos em um largo, escuro rio anónimo, que nasce na fonte de um acaso distante para desaguar em foz nenhuma, enquanto o homem, tranquilo como o Esteves da Tabacaria, vai picando as amêijoas e deitando as cascas no concheiro pré-histórico.
© nd
2 comentários:
Também gosto de te ler em prosa...Beijo
Obrigado, Amélia.
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