14.12.08

Saldos


Ilustração de O Livro das Maravilhas, de Marco Polo.

Por aqui, quero dizer, nesta cidade afogada entre serras geladas, há livros em saldo até à véspera de Natal, uma loja alugada pela minha livraria só para isso. Livros aos montes, separados por preços, cada lugar o seu preço. Desde um euro até quinze e mais. Dava para supor que os tivessem comprado a quilo, como sobejos de roupa de fábrica. As editoras são variadas e tanto que se poderia também julgar que, em vez de compras a quilo, eram restos de prateleiras que não se tinham aguentado na primeira maré do dilúvio que aí vem. Mas não. Era já o grupo Leya a tratar os livros como as sapatarias o calçado. No entanto, se é um acaso haver em saldos sapatos de qualidade, o mesmo já se não passa com os livros, felizmente. Alegremo-nos também portanto.

Gastei trinta e seis euros, depois de tudo mais ou menos vasculhado. O que trouxe:

A um euro:

Cartas de Amor de Anna Connover e Mollie Bidwell para José Maria Eça de Queiroz, Cônsul de Portugal em Havana (1873-1874).

A cinco euros (vi algum Pessoa publicado pela Assírio a esse preço):

Estudos de Literatura Portuguesa I, II e III, de Jorge de Sena, de que tinha apenas o volume III, e mesmo assim repeti-o (diziam-me estarem esgotados os outros volumes, o que em relação ao volume II se constata ter sido verdade: o que trouxe é em segunda edição).
O Cardo e a Rosa, Poesia do Barroco Alemão, selecção, tradução e prefácio de João Barrento.
Carta do Preste João das Índias, versões latinas medievais, organização, prefácio e notas de Manuel João Ramos, tradução de Leonor Buescu, com ilustrações medievas a cores, como a do topo.
A noite Dividida, de Sebastião Alba.
Do Cancioneiro de Amigo, de Stephen Reckert e José Macedo.

Entretanto, abri à sorte e por curiosidade um livro de Rosa Lobato Faria, e à quinta ou sexta linha fiquei enjoado com a espécie de português que li. Não, não há índices expurgatórios. Pelo contrário. Há o marketing que faz oportunidades excelentes de coisas que não prestam. E é para quem quer.

À saída, estava A Viagem do Elefante, de Saramago, lado a lado com uma publicação qualquer de José Rodrigues dos Santos.

Atrás de mim, uma multidão de desconhecidos mortos. Era um bom sítio para juntar em meditação quem escreve. Mas ainda era capaz de se ouvir um coro: olhem onde vieram parar Pessoa e Sena. Vida só há uma, e esses não sabiam nada de merchandising. Glória a José Rodrigues dos Santos, que está ali à porta ao lado do comuna do Saramago.

3 comentários:

Amélia disse...

E não havia por aí O Amante da Duras?-:)
Ainda bem que não estou aí...olha só o peso que, se calhar. levaria para casa...

Fred Matos disse...

Trinta e seis euros são, aproximadamente, pelo câmbio de hoje 118 reais. Aqui, com alguma sorte, se compraria dois bons livros, não mais.
Grande abraço, Nuno.

Anónimo disse...

Caro Nuno:

Onde é que vive? Ainda não consegui perceber, desculpe. Mas tenho compras de Natal para fazer e gostaria muito de encontrar a sua livraria. Palavra de honra que nunca na vida consegui gastar 36€ tão bem gastos.

Boa!

 
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