19.10.09

Poesia e Bacalhau à Brás

Bom, Sr. de Máscara e Chicote, então o Brás fica para o bacalhau, com um cheirinho de Glenfiddich (40 anos) a temperá-lo sem (grande) acento, acompanhado por Vat 69 com água lisa del grifo, à temperatura de Agosto. Ligação estupenda. É que eu não sabia o que era Fortinbras, não o ligava a Hamlet, daí que a mão me tenha fugido para um meio português de preto (ou de branco, é o mesmo), digo isto porque, com a minha mania do vernáculo, deveria ter escrito FORTIMBRÁS. Enfim, fiquei a saber que é o seu alter ego, mas do seu nome de baptizo, nicles. Assim é fácil bater.

Devolvido o seu mimo de abertura, leia o que escreveu (em estilo tardo-barroco):

"Há nitidamente poetas que ensaiam o não levar a sério o escrever livros de poesia – o que, sejamos sinceros, é comedidamente hipócrita numa pessoa que se dá ao trabalho de publicar – e outros que não levam mesmo o escrever livros de poesia a sério e que, não sendo hipócritas por publicarem, são, antes, parvos. Hugo Milhanas Machado, com Entre o malandro e o trágico, corre o risco de cair no limbo entre estas duas categorias."

Foi contra este seu leviano e semi-insultuoso arrumar de um poeta bastante jovem, em quem vejo valor e diferença, que me insurgi. Não o tivesse feito, e eu estaria calado, à espera do livro que afirmei claramente não ter lido. Quando se classifica um autor, como acima, e não apenas um livro, tem de se lhe conhecer a obra, e quando se fala de poesia é preciso saber falar dela, não ficar pelo comum das recensões, ainda por cima mal digeridas, e ser-se intelectualmente honesto. Não só não o foi no modo como argumenta em relação à minha reacção, mas também porque já trazia o HMM ferido na asa, numa entrada de Agosto passado, em que demonstra má-vontade para com o criticado e total ignorância acerca da poesia contemporânea espanhola, infelizmente muito mais viva e publicamente partilhada do que a nossa. Escreveu aqui:

"Vukusic, Fanjul, Clark, Martínez, Marqués, Moreno y De Ory: a nova poesia espanhola (ou sérvia ou inglesa) ou sete novos jogadores para o Villareal?
Aparentemente a nova poesia espanhola anda a seguir de perto as tendências da selecção portuguesa relativamente a estrangeiros. Só é pena não naturalizarem também o Hugo Milhanas Machado."

É preciso dizer que HMM nasceu em Lisboa em 1984 e que é professor leitor de Filologia Portuguesa numa universidade de Espanha.

Agora atente no que escrevi, a começar pelo título:

Um poeta e um só livro

Ainda não me chegou o último livro de Hugo Milhanas Machado, Entre o Malandro e o Trágico, que encomendei. Demoras que sucedem a quem vive mais perto da Cervantes do que da Poesia Incompleta ou da Trama. Dirão, por isso, que não posso falar do livro, como não posso, de facto. Mas posso abordar o que conheço da poesia de HMM.

Estou habituado a fintas e rasteiras, porque estou atento a elas. O seu alter ego incha tanto que até se esqueceu de pôr o fundamental para a compreensão do que afirmei na segunda transcrição que faz das minhas palavras:

mais, não toca, nem valoriza, em termos de marca de whisky, algo que é bastante saboroso na sua poesia e que me dirão ter sido já feito por certo modernismo, nomeadamente o concreto e sua deriva lusitana. É um gosto e um gozo seus, e também meus como leitor, a subversão sintáctica da Língua. Consegue ultrapassar a estafada desconstrução pela desconstrução, usando-a para construir a sua linguagem poética em termos consequentes, inteligíveis e honestos.”. E a seguir engoliu o que não lhe convinha: Uma lufada de ar fresco nunca foi uma corrente de ar. Lá irei ao livro depois de me chegar, dando a mão à palmatória se estas características não estiverem em Entre o Malandro e o Trágico.

Mais afirmo que a poesia de Hugo Milhanas Machado é, em tudo, diferente, senão quase oposta ao que escrevo, e este quase fica para a expressão inteligível de assuntos comuns do humano. Não há aqui "companheirismo cego" e "protecção", mas o mesmíssimo entusiasmo de quando descubro poetas jovens, bons e promissores, e HMM não é o primeiro. Não sou crítico de poesia como o Sr. Fortinbras pretende ser, mas gosto de pensar sobre ela.

Tudo o que afirmou, Sr. Fortinbras, cai por terra apenas com uma ligeira brisa. Sei bem e penso o que escrevo. Julgo que devia tentar fazer o mesmo. Já o conheço de outro blogue que estimava e que, vivendo ainda, me cansou. Vai ver que com este está a passar-se o mesmo.

Ah, e sabe uma coisa? Havia nesta cidade um restaurante célebre de um homem célebre por ter esse restaurante. Vinha gente de todo o país, gulosa de gastronomias regionais, que não poucas vezes eram um bluff. Fui lá, se tanto, três espaçadas vezes, e não pus mais os pés nele, desde que o dono, no auge da celebridade, apresentou a ministros a iguaria regional nec plus ultra: sardinhas assadas com pão-de-ló. Dizia que era comida das aldeias, e não mentia. Talvez não soubesse é que provinha dos garimpeiros do volfrâmio. Estavam tão ricos que lhes parecia pouco adequado comerem sardinhas com a velha broa, e que coisa melhor para a substituir que um pão rico? Pão-de-ló com sardinhas portanto. Assim, os seus whiskies. Não se ofenda, mas olhe que o comportamento de mau-gosto é idêntico.
 
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