17.1.21

Nota Sobre a Peste


A covid 19, como todas as pestes, é uma guerra com um só lado e muitas frentes, e essas frentes não estão unidas, as intenções, maioritárias ou não, estão longe umas das outras, e o carácter das pessoas e a falta dele fazem-me lembrar a invasão de França pela Wehrmacht em 1940, os franceses que a admitiram e a Resistência que a combateu. Talvez por isso me tenha ficado a ideia de que os generais gauleses eram fracos e não apenas o armamento obsoleto de que dispunham. Assim hoje nesta guerra, com a agravante de, nos estados-maiores, se lutar com o olho em sondagens eleitorais e na economia unilateral, cuja defesa os exércitos pagarão integralmente com vidas e pobreza, mas não os seus generais, semelhantes aos da França invadida, e muito menos os reis do mundo, cuja fortuna de zeros incontáveis à direita tem crescido e crescerá, sem escândalo, sobre as vítimas da peste. Dizem nas chancelarias que pouco se sabe do vírus e, com o respaldo objectivo dessa ideia, enfrentam-no com inépcia e lentidão, como na invasão da França de 1940, sabendo o que já se conhece da peste e aproveitando tardia e parcialmente a experiência de quem a combate com resultados, sem ir aí buscar práticas e a tão importante rapidez de decisão. Entretanto, seja-se optimista, não se pense sequer no futuro imediato, a lei das probabilidades joga a favor da sorte de cada um (primeiro morrerá o vizinho), e, felizmente para o seu sossego, a maioria desconhece que a estratégia da infecção é multiplicar-se exponencialmente, segundo o aumento dos infectados e, em consequência, do território ocupado. Os reis, nos seus cálculos, desde já contam com isso e com a esperança que é para todos nós a vacina e sabem que os despojos de guerra engordam a tesouraria com a demora da libertação e com a falta de disciplina sanitária. Que o digam Trump e a revista Forbes. Mas isso já não tem a ver com governos e eleições, e fazer parte do circo vale bem a carreira.

 
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